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10 coisas que aprendi com o modelo de inovação israelense | Parte 02

Daniela Klaiman

12/09/2019 04h00

Na semana passada falei sobre os cinco primeiros aprendizados que obtive com a minha experiência em Israel. Em uma rápida recapitulação, posso dizer que:

10º  Pense e faça tudo como uma startup. Israel é uma startup de 70 anos, que viu em sua história a necessidade de se desenvolver e construir uma nação diante de diversas adversidades climáticas, sociais, políticas e econômicas.

9º  Inovação só acontece em um ambiente de liberdade e diversidade. Com uma cultura liberal, Israel é um país em que mulheres são a metade no exército e o casamento entre pessoas do mesmo gênero é legalizado.

8º O mundo todo pode ser o seu mercado. Israel não possui mercado interno, mas soube inovar, se desenvolver e foi através da exportação dos seus conhecimentos que se tornou uma das maiores referência do mundo em tecnologia de ponta.

7º Empreendedores mais velhos criam negócios mais sustentáveis. Os empreendedores israelenses chegam mais velhos ao mercado de trabalho e criam suas startups já com a bagagem de vida, escola e exército e tem um perfil muito diferente dos outros países.

6º Educação é o pilar que mais impulsiona a inovação. É, na maioria das vezes, nas escolas e universidades que a tecnologia é introduzida ao israelense e ali são oferecidos grandes incentivos para que os alunos criem seus próprios negócios.

Seguindo esse pensamento, vou trazer meu top 5 aprendizados que tive com o modelo de inovação israelense:

5º Investidor precisa ter coragem e apetite para risco.

Em 2018 Israel bateu o recorde de investimentos em startups no país. Foram US$6.47 bilhões investidos, que representam um aumento de 17% em relação à 2017.

Além disso, Israel possui mais de 70 empresas de investimento de capital de risco, enquanto no Brasil temos mais ou menos 25 fundos desse segmento.  

E como um mini país consegue esses números impressionantes?  

Com uma combinação entre tecnologia de ponta e altamente escalável e um número grande de investidores preparados, maduros e que tem apetite por risco. O investidor lá entende seu papel, sabe que ele precisa estar conectado com pontos de interesse da startup e que deve gerar oportunidades para sua investida.

Dessa maneira, lá acontece uma coisa totalmente impensável: muitas vezes são os investidores que correm atrás das startups para poder investir! Eles fazem o pitch para o empreendedor explicando porque ele é o investidor mais estratégico para a empresa naquele determinado estágio.

4º Inovação deve ser uma agenda do governo.

Se você quer abrir uma startup, o governo investe em você!

A presença do governo sob a inovação é muito clara. Entre um dos departamentos do ministério da economia israelense temos o chamado Israel Innovation Authority, com a missão de encorajar a inovação e empreendedorismo através da indústria da ciência e tecnologia.

Portanto, o título de Startup Nation serve não só para atrair investidores, profissionais, turistas ou interessados, mas foi percebido há tempos como um agente de transformação da economia interna do país.

Um dos programas do Israel Innovation Authority oferece contrato com uma aceleradora em troca de 20 a 50% de equity mais a cobertura de 15% dos custos em pesquisa e desenvolvimento. Os outros 85% dos custos em pesquisa e desenvolvimento é o governo que banca! Sem pegar equity! Sem contrapartida! 

Se o empreendedor se dá bem, o país é o maior beneficiado. Esse é o mindset israelense.

3º Um exército com multipropósito consegue proteger uma nação ao mesmo tempo que faz ela evoluir. 

O serviço militar é a base mais forte da sociedade israelense (já que o país vive uma guerra incessante) e é obrigatório para todo cidadão israelense. São 3 anos para os homens e 2 para as mulheres. 

E o exército lá não é brincadeira. Só para se ter uma ideia, toda semana Israel sofre ataques aéreos (bombas e mísseis vindas dos países vizinhos e Gaza). E para defender o país dessas ameaças, foi criada uma tecnologia única no mundo chamada Iron Dome ou Domo de Ferro, que conseguem interceptar no céu e abater a grande maioria das bombas antes mesmo delas atingirem o solo israelense. 

É na chamada unit 8200 que esse tipo de tecnologia é desenvolvida e a inovação é desejada. A 8200 é considerada a melhor unidade em inteligência militar e cibersegurança do mundo. 

Assim, servir ao exército lá é sinônimo de honra, aprendizados e abertura de muitas oportunidades pessoais. 

Não é a toa que os ex-alunos da unidade 8200 são disputados ao sair do exército. E aqueles que não optam por trabalhar nas grandes empresas, acabam criando suas próprias startups, como é o caso da Wix, plataforma para amadores de criação de websites profissionais, hoje avaliada em US$ 6 bilhões.

2º É necessário criar um Ecossistema de Inovação.

Todos os pilares de inovação aqui citados estão conectados: investidores, aceleradoras, universidades, empresas, exército, universidades e governo. Um ajudando ao outro, todos se complementam e apoiam. O empreendedor entra no ecossistema e vai sendo conduzido pelos próprios players para a melhor posição. O objetivo é fazer virar e não importa quem se dá bem e quando, mas que no final, todos sairão realizados. 

Talvez o maior segredo de Israel: o seu ecossistema de inovação. 

Um ecossistema protecionista em relação ao mercado. Investem em empresas que são de Israel e que vão ficar e desenvolver novos negócios em Israel, seguindo o ciclo em que receita e investimento se retroalimentam. 

Ecossistema de inovação israelense

1º  Inovações vêm de um propósito coletivo

Um país cheio de escassez, que vive em guerra e que praticamente não tem mercado interno precisa olhar para problemas globais como fonte de inspiração para criação de startups escaláveis e rentáveis.

Assim, Israel é o berço de negócios que que servem a um propósito coletivo. Como exemplo, esse ano foi impresso por lá o primeiro coração em 3D a partir de tecidos humanos. O órgão foi recriado através de células do próprio paciente e o feito abre a esperança para a realização de transplantes no futuro através das impressoras de órgãos, que já vêm sendo testadas. 

Outro case incrível é o Orasis, um colírio que foi criado para cura da perda da visão com uma gota. Ou seja, escala global e produto israelense.

É essa pra mim a parte mais bonita da Startup Nation, uma nação que caminha para um único lugar. Com o mesmo propósito. 

Sobre a Autora

Futurista formada em tecnologia e futurismo pelo TIP – Transdiciplinary Innovation Program da Universidade de Jerusalém. Expert em Consumer Behavior and Trends Research, Pós-graduada em Coolhunting & Trends pela Universidade de Barcelona e foi diretora de Planejamento e Consumer Insights da Box1824 durante 5 anos. Consultora e palestrante nas áreas de inovação, pesquisa de mercado, desenvolvimento de produtos, comportamento do consumidor e transformação digital, atua junto a grandes empresas mostrando o que elas devem fazer para sobreviver a esse novo mundo que vivemos e mudanças rápidas. Co-fundados de 2 startups: Unpark e WinWin.

Sobre o Blog

É possível analisar o futuro por 2 ângulos diferentes: aquele mais imediato, que prevê os acontecimentos dentro de 0 a 5 anos e é estudado e aprendido através do comportamento das pessoas; e outro ângulo mais longínquo, que enxerga um intervalo de tempo de 5 a 50 anos e que é totalmente baseado no desenvolvimento e uso da tecnologia. A ideia desse blog é justamente analisar os dois futuros juntos e entender como a tecnologia vai influenciar nossas vidas e como a forma como vivemos e nossos valores influenciam a tecnologia, atingindo um balanço complexo, porém em linguagem simples e quase chula, para que todos possam começar a pensar no futuro e entender que somos nós os responsáveis por construir um cenário positivo para todos. Ou não. O futuro está em nossas mãos e é um assunto urgente de ser tratado hoje.